O interesse por esse assunto tomou conta do país. São diversas mesas redondas, debates acalorados e simpósios acadêmicos focados nessa temática. Mas, por quê?
A resposta para esse fenômeno encontra-se na indignação social, que já não suporta ver gente morrendo estupidamente e o causador dessas tragédias sem punição ou com uma reprimenda estatal desproporcionalmente inferior ao dano causado.
O crescente número de vitimas da imprudência alheia, lotam o sistema de saúde, já carregado de problemas; médicos já esboçaram suas preocupações ao afirmarem não haver condições para atender a todos aqueles que necessitam de atendimento hospitalar. O juiz que concede fiança é o mesmo que pune severamente o ladrão, o estelionatário e o estuprador.
Contudo, apesar de serem igualmente crimes sérios, quando se trata daqueles ilícitos decorrentes de eventos no trânsito brasileiro, aparentemente as autoridades caem na falácia do “acidente”.
Um acidente, por definição, é evento incerto e não desejado, cuja ocorrência é imponderável. Já um ilícito é, no mínimo, previsível, porque o legislador definiu a conduta incriminadora.
Quem bebe e pega um veículo automotor, ainda que o guie prudentemente, estará cometendo um ilícito, porque põe em risco o próximo. Aquele que imprime maior velocidade pelas ruas, igualmente assume o risco de causar danos e, portanto, também comente ilícito da mesma natureza.
A par disso, toda a sociedade, e aqui incluímos as entidades representativas de classe, como a OAB, deve ser mobilizada, para promover a reforma legislativa que, no fundo, seja capaz de compatibilizar a proporcionalidade e a razoabilidade das punições.
Outro dia, em discussão com um grupo de advogados e acadêmicos da UFMS, nos posicionamos contrários ao entendimento do Supremo Tribunal Federal que assentou, em apertada síntese, ser o delito de homicídio no trânsito um delito essencialmente culposo, porque deriva da imprudência, negligência ou imperícia.
Naquela oportunidade deixei claro que o agente que bebe algumas doses de cerveja e sai dirigindo, já estaria cometendo um ilícito, segundo a lei nº 9503/97. E, vindo a ocorrer um atropelamento, por exemplo, seguido de morte, haveria, também, um homicídio agregado à conduta primária, e que da conjugação desses dois delitos não poderia resultar em uma conduta culposa.
Neste artigo não é possível minuciar em detalhes a minha compreensão, mas posso sintetizar na seguinte premissa: se alguém, pelo simples fato de beber e dirigir está a cometer um crime, porque se trata de um delito de mera conduta, como quer o STF, e vier a atropelar e matar alguém cometerá único delito culposo (por imprudência)?
Entendo que isso seria impossível, porque na hipótese há um delito de mera conduta que antecede logicamente o delito de homicídio e, não há como, juridicamente, compartimentar ambas as condutas.
Sei que alguns juristas vão criticar esse posicionamento, aduzindo dentre outros argumentos o de haver, para a espécie, a incidência do princípio in dubio pro reo. Todavia, é preciso deixar claro que, em fase embrionária de um processo (no inquérito), ou nas fases iniciais deste (na denúncia), o Estado deve observar outro princípio, o de que o interesse de muitos se sobrepõe ao de um único e, portanto, reconhecer que o delito, qualquer um deles, deve ser cabalmente conhecido e punido, se necessário.
Cumpre apontar algumas pequenas diferenças pontuais. No Japão, país reconhecidamente de primeiro mundo, o índice de condenações chega a 87%. Lá, qualquer criminoso sabe que receberá uma justa punição e a sociedade espera esse comportamento por parte do Estado. No Brasil, por outro lado, e bem por conta do movimento denominado garantismo penal, esse índice de condenações não chega a 33%.
Esses dados são públicos e estão a desafiar aos que se dispõe a estudar o problema e a fornecer soluções. Eu estou ciente de que é preciso comover o Congresso Nacional para mudar a lei e assim provocar uma mudança de comportamento. E você?
Fonte: http://www.oestadoms.com.br/
Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT
RODRIGUES JUNIOR, Luiz Carlos Saldanha. O homicídio no trânsito: como tratar esse crime? Blogger. Disponível para consulta em: <http://artigosprofessorsaldanhajr.blogspot.com/2011/11/o-homicidio-no-transito-como-tratar.html>. Acesso em: 28/11/2011.